sábado, 30 de dezembro de 2023

Histórias em quadrinhos utilizadas para narrar experiências pessoais




Em 2021, o quadrinista Lino Arruda publicou a história em quadrinho Monstrans: experimentando horrormônios, na qual explora as suas experiências como pessoa com deficiência, transmasculina e com lesbianidade, representando-se com uma forma mutável entre humano e criatura. Essa publicação chamou a atenção de Ícaro S. Gonçalves, que decidiu ter o trabalho de Arruda como foco de suas pesquisas acadêmicas. Nesse sentido, apresentou um trabalho sobre o tema nas 7as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos, que acaba de ser publicado em forma de artigo científico no dossiê dedicado ao evento pela revista 9a Arte (Vista do Dissidência corporal e monstruosidade em Monstrans (usp.br)). 

O estudo desenvolvido por Ícaro busca analisar a representação do autor na obra quadrinística, levantando questões de corporalidades dissidentes, gênero e sexualidade, observando como estas são representadas pelo quadrinista ao narrar e ficcionalizar suas próprias vivências. Para tal, considerou várias teorias sobre quadrinhos, a análise das representações gráficas do horror,  proposições sobre escrita de si, bem como questões de gênero e observações sobre vivências trans no âmbito da psicanalise.

Trata-se um texto instigante, que abre espaço para vários questionamentos sobre aspectos específicos envolvidos na representação da individualidade nas e pelas histórias em quadrinhos.

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

Revista 9a Arte completa seu volume 11



Com a publicação de mais duas resenhas e o editorial, a revista 9a Arte fechou nos últimos dias de dezembro o seu volume 11, referente a 2023 (Edições anteriores | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br)

Adotando o sistema de publicação de fluxo contínuo, em que os artigos são disponibilizados à medida que são avaliados e aprovados para publicação, a revista publica em média cerca de 10 artigos nacionais e 1 internacional por ano, além de 4 resenhas, números que podem variar para mais dependendo das contribuições recebidas. A revista aceita artigos científicos sobre histórias em quadrinhos e temas correlatos, em todas as áreas do conhecimento

Atualmente, além do volume normal - o 11, recém-fechado -, a revista 9a Arte está também publicando um dossiê especial dedicado aos trabalhos apresentado às 7as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos (2023: Dossiê da 7a Jornada Internacional de HQ | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br), realizadas em agosto de 2023, que já conta com 17 artigos publicados.

As submissões de artigos para a revista 9a Arte estão permanentemente abertas e podem ser realizadas no endereço Submissões | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro


quinta-feira, 28 de dezembro de 2023

Pesquisadora do Observatório de Histórias em Quadrinhos alça voos mais altos

(Imagem disponível em GEISA FERNANDES – Brasil – Poesia dos Brasis – Rio de JaneiroGEISA FERNANDES – Brasil – Poesia dos Brasis – Rio de Janeiro - www.antoniomiranda.com.br)


Tal como os pais com seus filhos, um núcleo de pesquisas não tem ideia do que o futuro traz para aqueles que o frequentam quando estão em seu período de formação. A vida inevitavelmente os leva para pontos distintos. Muitas vezes, àqueles que ficam resta apenas a admiração por ver quão longe puderam ir seus “pupilos” e um pouco de orgulho - ninguém é de ferro! - por terem a ilusão de haver colaborado em algo para esses resultados. É um círculo virtuoso surpreendente.

Geisa Fernandes D´Oliveira é um desses casos. Defendeu seu doutoramento em 2010 sob a égide do Observatório de Histórias em Quadrinhos da ECA-USP, enfocando a temática das reconstruções identitárias nas histórias em quadrinhos (Saberes enquadrados: histórias em quadrinhos e (re)construções identitárias (usp.br). Desde então, realizou muitas atividades que a levaram a trilhar caminhos inusitados pelo mundo das Artes e da Pesquisa. É escritoracantora e compositora premiada, tendo realizado shows e lançado vários CDs (http://www.geisafernandes.com/). Atualmente, pesquisa as ligações entre o jazz e as histórias em quadrinhos, tema sobre o qual está preparando um artigo para a revista 9ª Arte, periódico científico online do Observatório (9ª Arte (São Paulo) (usp.br)).

A partir de meados da década passada, Gêisa Fernandes (seu nome artístico) passou a colaborar com o Prof. John Lent, renomado pesquisador de quadrinhos, no Comic Art Working Group da International Association for Media and Communication Research (IAMCR) uma das associações científicas mais conceituadas das áreas de Comunicação e Mídias. O grupo de trabalho foi fundado pelo Prof. Lent em 1984, constituindo-se em um fórum permanente de discussão e aprofundamento sobre os rumos da pesquisa em histórias em quadrinhos. Entre 2016-2020, Gêisa foi coordenadora do grupo, tendo organizado as reuniões anuais, apresentado trabalhos e desenvolvido projetos, dentre os quais a produção de um ebook - The Comic Art Working Group (first) Top 10 -, e um podcast com os destaques da pesquisa produzida no grupo.

O ebook, depois de algumas adversidades devido à eclosão da pandemia de COVID, ficou pronto em 2023 e logo estará disponível para os interessados. Ele traz uma seleção dos melhores trabalhos apresentados ao Grupo nos primeiros 35 anos de atuação. Certamente, uma coletânea digna de fazer parte do acervo de todo pesquisador da área de quadrinhos.

O podcast Comic Art Working Group Comments on the Top (https://www.spreaker.com/show/comments-on-the-top). Assim como o e-book, a ideia do podcast surgiu como uma forma de comemorar os 35 anos do Comic Art Working Group. Porém, se o e-book contava com uma equipe de colaboradores, a produção do podcast ficou inteiramente sob responsabilidade da própria Gêisa, que se saiu muito bem na empreitada.

A proposta do podcast era ouvir o depoimento de pessoas que participaram do grupo ao longo dos 35 anos. A lista de convidados foi definida pelo Prof. Lent. Cada convidado recebeu a orientação de falar sobre sua pesquisa e a relação com o grupo. A primeira temporada contou com 10 episódios de duração entre dois e quinze minutos, entre 08 de setembro e 10 de novembro de 2022. Após a conclusão da primeira temporada, Gêisa, juntamente com o Prof. Lent, decidiu realizar uma segunda, enfocando os contemplados com o Best Paper Award, prêmio concedido pelo grupo ao melhor trabalho apresentado em cada encontro. A segunda temporada foi lançada 08 de setembro e terminou em 20 de novembro de 2023. Foram feitas algumas alterações, como a inserção de músicas e roteiros dividido por temas. No total foram outros 10 episódios, com duração entre 7 e 20 minutos.

O que reserva o futuro para essa desbravadora? Podemos apenas imaginar. Mas se o período se esses quase quinze anos desde seu doutorado servem de referência, certamente ela tem muitas realizações pela frente. Projetos e energia para tanto nunca lhe faltaram.

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro


quarta-feira, 27 de dezembro de 2023

O vai e vem dos reboots


Na década de 1960, Umberto Eco, em seu ensaio "O mito do Superman", analisou as histórias do Homem de Aço então publicadas e demonstrou que, pelo processo narrativo então predominante nas histórias, o protagonista estava sempre renovado, cada história sendo como que a primeira aventura que vivia nas páginas dos quadrinhos. Uma história não tinha relação com a anterior ou com aquela que a sucedia e, assim, o personagem estava sempre da mesma forma. Não envelhecia, não caminhava para o desgaste.

O raciocínio do pensador italiano era perfeito para a época. No entanto, de lá para cá, muita água correu debaixo da ponte e as histórias de super-heróis se modificaram. O modelo narrativo próximo da soap-opera, inaugurado nos quadrinhos por Stan Lee e sua editora Marvel Comics, em que as histórias e os heróis se correlacionam e formam um universo narrativo, levou os personagens a um processo de envelhecimento e desgaste. Para resolver essa questão surgiram o reboot, "reinício –, para trazer histórias já conhecidas como  uma  nova  criação  para um novo contexto de produção que visa a permanência  cultural  de  um  personagem – ou “universo” de personagens –, e seu valor de mercado enquanto uma marca potencialmente lucrativa".

A definição acima nos é oferecida pelo pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro Robson Santos Costa, no artigo constante do dossiê das 7as. Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos, publicado pela revista 9a Arte, o artigo intitula-se "Vamos contar de novo?: gêneros discursivos, adaptação e memória cultural em filmes do Homem-Aranha". Nele, o autor analisa o papel da memória e da memória cultural no processo de adaptação entre e no interior de gêneros discursivos no mercado cinematográfico de super-heróis, enfocando três adaptações do personagem de histórias em quadrinhos Homem-Aranha: Homem-Aranha, de 2002; O Espetacular Homem-Aranha, de 2012 e Homem-Aranha, de volta ao  lar, de 2017.  

Como  referencial  teórico, o autor utiliza Bakhtin (1997) que compreende os gêneros discursivos como um conjunto de enunciados semelhantes; Assmann (2011), Erll (2010) e Heller (2003) para conceituar  a  memória  cultural,  vista  como  uma  construção  oriunda  dos  vestígios  que emanam de obras culturais; Hutcheon (2013), que compreende a adaptação como um processo  que  constrói  algo  novo;  e  Todorov  (2013)  em  sua  ideia  da  tensão  entre diferença  e  repetição  na  elaboração  de  narrativas. Para trabalhar metodologicamente a  ideia  de  construção  de sentidos  por  meio  de fragmentos fílmicos, utiliza Vanoye  e  Goliot-Lété  (2011)

Conclui que a adaptação utiliza a memória como elemento do processo  de  construção  enunciativa,  sendo  fundamental  na  produção  de  obras  da indústria  cultural  e  sua  dinâmica  de  diferença  e  repetição  para  a  produção  de  uma memória cultural.

O artigo está disponível para leitura e download em Vamos contar de novo? | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

quarta-feira, 20 de dezembro de 2023

Uma história em quadrinhos para ensinar educação sexual


É o que propõem Mariana Silva Pinto, Maria Aparecida Alves da Silva e Hylio Laganá Fernandes, da Universidade Federal de São Carlos, Campus Sorocaba, em artigo recém-publicado pela revista 9a Arte, do Observatórioo de Histórias em Quadrinhos da ECA-USP.

Integrante do dossiê das 7as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos, o artigo reflete sobre o processo criativo de uma história em quadrinhos sobre sexualidade, temática amplamente transpassada por fatores sociais e tabus em nossa atual sociedade. No texto, os autores relatam como se deu esse processo criativo de um quadrinho produzido como material didático para a educação sexual, destinado a adolescentes estudantes dos anos finais do ensino fundamental e ensino médio

Os resultados, mostrando os detalhes das tomadas de decisão, apontam a potência do trabalho coletivo e a importância do diálogo e da abertura para mudanças no processo de criação, em particular quando o tema e público-alvo estão definidos previamente. Ao final, os autores concluem que "as abordagens de temas com inúmeros bloqueios, como a Educação Sexual, por meio de universos fantasiosos pode vir a ser uma excelente alternativa" para superar a barreira do tabu.

Quem quiser conferir as propostas do artigo, basta acessar "Fada da contracepção: o processo criativo de uma história em quadrinhos voltada para educação sexual" no endereço Fada da contracepção | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

sexta-feira, 15 de dezembro de 2023

Artigo Internacional da revista 9a Arte trata de quadrinhos no Uruguai


Em artigo especialmente elaborado para a revista 9a Arte, a estudiosa uruguaia Maria Victoria Saibene discorre sobre o desenvolvimento das histórias em quadrinhos no Uruguai desde a origem até as primeiras décadas do século XXI. A autora, que tratou do mesmo tema na palestra de encerramento das 7as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos (apresentação disponível em 7as. Jornadas de HQ - Conferência de encerramento - Victoria Saibene (HQ no Uruguai) (youtube.com)) realizadas em São Paulo em agosto de 2023, discorre no artigo sobre os principais autores, personagens e fatos que influíram no atual panorama quadrinístico em seu país. 

Especial destaque recebe da autora o papel desempenhado pelos Fondos Concursables, um programa governamental para incentivo à produção cultural, criado no início dos anos 2000. Esses. Fondos, realizando uma criteriosa seleção e financiando os autores com melhores propostas criativas, têm atuado de forma destacada como impulsionadores da produção quadrinística no país, sendo responsável pela publicação de diversas obras.

Outro ponto de especial destaque no artigo é a produção de histórias em quadrinhos de temática histórica, que tem recebido grande apoio por parte das autoridades do país vizinho. Nesse ambiente de ebulição criativa, uma contribuição decisiva tem sido dada pelo evento Montevideo Comics, uma megafeira de quadrinhos e cultura pop - semelhante à CCXP, que ocorre anualmente em São Paulo -, à divulgação e valorização dos quadrinhos, ajudando a congregar e organizar público, editoras e artistas. Nesse âmbito de iniciativas positivas para os quadrinhos, destaca-se a Asociación Uruguaya de Creadores de Historietas (AUCH), criada para fortalecer os artistas do país.

O artigo está disponível no endereço Um panorama das histórias em quadrinhos do Século XXI no Uruguai | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro


Por Tutatis! Vamos para as aulas de História



O título desta nota bem poderia estar na boca do gaulês Asterix, ao saber que suas peregrinações e proezas pelo Império Romano governado pelo imperador Júlio César podem ser instrumento de ensino em aulas de História para o ensino fundamental e médio. Esse ponto de vista é defendido pelo historiador e pós-graduando (latu sensu) da Universidade EST, Iuri Biagioni Rodrigues, em trabalho que apresentou nas 7as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos e que acaba de ser publicado no dossiê especial da revista 9a Arte.

No artigo, intitulado "Possibilidades de utilização das histórias de Asterix no ensino de História", Iuri busca abordar como pode ocorrer a utilização dos quadrinhos de Asterix nessa área de ensino, defendendo que eles possuem uma versatilidade de temas que podem ser trabalhados em sala de aula, como conceitos, povos antigos e locais históricos

Os objetivos dos artigo envolvem fazer uma revisão de literatura sobre o tema e demonstrar a aplicabilidade das histórias de Asterix em aulas de História. Para isso, o autor realizou uma análise de livros, artigos e dissertações de mestrado sobre este assunto. Conclui que os quadrinhos são uma interessante, instigante e motivante fonte de pesquisa em História e as diversas histórias de Asterix , especialmente, podem ser bem aproveitadas no ensino de História Antiga para torna-lo mais dinâmico e divertido.

Interessados em conhecer o artigo na íntegra pode fazer isso no endereço Possibilidades de utilização das histórias de Asterix no ensino de História | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro


quarta-feira, 13 de dezembro de 2023

Como as histórias em quadrinhos enfocaram duas tragédias recentes no Brasil


Em 27 de março de 2023, na cidade de São Paulo, a professora Beth foi morta por um adolescente de 13 anos. Poucos dias depois, em 5 de abril, um homem matou quatro crianças em uma creche na cidade de Blumenau, em Santa Catarina. Duas tragédias recentes, ambas em ambiente escolar, que chocaram a sociedade brasileira.

Foram tragédias inusitadas, que levantaram muitas dúvidas e indagações. Por que ocorreram? O que motivou os perpetradores desses crimes? Que circunstâncias concorreram para que eles ocorressem. Tendo essas questões como pano de fundo, Maria Isabel Borges, professora e pesquisadora da Universidade Estadual de Londrina, Paraná, resolveu pesquisar como o mundo das histórias em quadrinhos reagiu às tragédias, analisando a produção de três quadrinistas que publicam em mídias sociais.

O resultado dessa pesquisa é apresentado no artigo “Tragédia na escola: quadrinhos, percepção e representação”, em que a professora mostra a percepção dos artistas Alisson Affonso, Genildo e Daniel Lafayette sobre essas duas tragédias, buscando relacionar linguagem, representação e performatividade a partir da compreensão da linguagem quadrinística. Para isso, ela realizou a análise de seis textos em quadrinhos, publicados no Instagram.

A pesquisa permitiu concluiu que os quadrinistas compartilham a linguagem dos quadrinhos na sua atividade artística e profissional, mas não percebem e/ou representam as duas tragédias igualmente. Cada um deles realiza escolhas e assume responsabilidades quando os textos se tornam públicos. Atuam como “porta-vozes” das vítimas (Alisson e Genildo), críticos da sociedade e do bolsonarismo (Lafayette, Genildo e Motta).

Esse instigante artigo, publicado no dossiê especial das 7as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos da revista 9ª Arte, pode ser lido e baixado no endereço https://www.revistas.usp.br/nonaarte/article/view/219554.

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

terça-feira, 12 de dezembro de 2023

Itamaraty e Bienal Internacional de Quadrinhos de Curitiba lançam podcast especial com 10 episódios

O universo diverso e potente dos quadrinhos brasileiros está também na sua plataforma de streaming favorita! O PROGRAMA BRASIL EM QUADRINHOS, uma parceria do Itamaraty com a Bienal de Quadrinhos de Curitiba, lança o PODCAST HQ BRASIL – Quadrinhos, Cultura e Educação.



O primeiro episódio, já disponível, é com MARCELO D’SALETE @marcelo.dsalete , vencedor do Prêmio Jabuti 2023 com a HQ “Mukanda Tiodora”, que resgata as ideias abolicionistas da São Paulo da década de 1860. A apresentação e a curadoria são do jornalista Pedro Brandt, da equipe do site Raio Laser.

Serão 10 episódios ao todo, lançados semanalmente, que reforçam a pluralidade da produção contemporânea de quadrinhos no Brasil. Participam além de D’Salete, Ilustralu, André Toral, Lelis, Gidalti Jr., André Diniz, e as duplas Marcelo Quintanilha & Rogério de Campos, Alcimar Frazão & Lobo, Sirlene Barbosa & João Pinheiro e Leandro Assis e Triscila Oliveira.
 
Uma das temáticas abordadas nesta temporada é o uso do quadrinho no ensino da língua portuguesa, o que aproxima professores que já utilizam HQs em sala de aula com os artistas e seus respectivos processos criativos.

A ação educativa do Itamaraty, que transformou os quadrinhos brasileiros em vetor de ensino do idioma, foi concebida pelo Instituto Guimarães Rosa de Lima, no Peru, expandindo a produção da nona arte mundo afora, e unindo ouvintes de podcasts a leitores de quadrinhos.

Trata-se da segunda ação do Itamaraty (Ministério das Relações Exteriores) em conjunto com a Bienal Internacional de Quadrinhos de Curitiba.


Seguem informações sobre o novo podcast no Spotify:(https://open.spotify.com/show/7KsEE8GyUqKJc8PvHLcjHV)

Celbi Vagner de Melo Pegoraro

segunda-feira, 11 de dezembro de 2023

Revista 9a Arte publica resenha sobre livro de crítica de quadrinhos


ZIP! Quadrinhos & Cultura Pop, livro de autoria de prof. Ciro Marcondes, da Universidade Católica de Brasília, é o objeto da resenha recém-publicada no volume 11 da revista 9a Arte, periódico eletrônico do Observatório de Histórias em Quadrinhos da ECA-USP.

A resenha, assinada por Celbi Vagner de Melo Pegoraro, pesquisador do Observatório, destaca as principais características do livro de Marcondes, dando ênfase ao fato de que se trata da seleção e coletânea de uma série de textos sobre obras em quadrinhos, elaboradas pelo professor desde 2011, na webpage Raio Laser (RAIO LASER).

A apreciação crítica de Celbi também salienta a escassês, no ambiente editorial brasileiro, de obras que se proponham a realizar a crítica de quadrinhos de maneira mais séria, fugindo das declarações entusiasmadas dos fãs do gênero. Nesse sentido, o trabalho de Marcondes pode ser visto como um alento para a área, trazendo, nas palavras do resenhista, "títulos que dialogam não apenas com seu interesse pessoal, mas com uma análise que comprova o quão sofisticada é a linguagem dos quadrinhos em seus mais diversos gêneros e formatos". 

Esperamos que essa obra possa inspirar outros autores a desenvolver trabalhos semelhantes, ajudando a aprimorar a crítica de quadrinhos no país.

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro


sexta-feira, 8 de dezembro de 2023

A inventividade da Disney europeia


Desde a década de 1930, os quadrinhos Disney são produzidos na Europa sob licenciamento da empresa estadunidense. Entre os europeus, os roteiristas, artistas e editores italianos destacaram-se pela inovação e pela engenhosidade. Romano Scarpa, Giorgio Cavazzano (ainda na ativa), Giovan Battista Carpi, Massimo de Vita, entre outros, ganharam notoriedade entre os fãs de vários países e legaram suas formas gráficas e sua originalidade à nova geração de quadrinhistas, a exemplo de Casty (Andrea Castellan).

Este último tem como inspiração a obra de Romano Scarpa, um dos quadrinhistas que ajudou a definir o “estilo italiano” dos fumetti Disney, e que também criou novos personagens e roteiros diferentes dos tradicionais. No Brasil, a edição dos quadrinhos Disney esteve aos cuidados da editora Abril por 68 anos. Agora, essas novas histórias têm sido publicadas nas páginas das revistas produzidas pela Culturama, especialmente no título bimestral O Grande Almanaque Disney, que, pela quantidade maior de páginas, comporta narrativas mais longas.

A editora francesa Glénat, fundada em 1969 por Jacques Glénat, é responsável por álbuns de grande beleza estética e realizados por diversos nomes do quadrinho europeu da atualidade. Há edições com formatos diferenciados, como Café “Zombo”, que recria, em um álbum horizontal, as tiras de aventuras do Mickey feitas por Floyd Gottfredson na década de 1930. No álbum Mickey All Star, diversos artistas criam uma página cada um, sempre com o ratinho entrando por uma porta na primeira vinheta e saindo por outra na última. Este personagem também é o protagonista de A Juventude de Mickey, na qual ele conta para seu incrédulo netinho as aventuras que vivenciou; Misteriosa Melodia, que apresenta a primeira vez em que Mickey vê a Minnie, em uma prequela ao desenho animado O barco a vapor; e Super Mickey, na qual os super amendoins do Pateta ajudam Mickey a frustrar a fuga de bandidos, entre eles o Bafo-de-Onça. A computação gráfica é usada em Horrifikland para realçar a narrativa de terror.

Não se pode esquecer o pato Donald estrela de As mais alegres aventuras de Donald, onde apronta muitas confusões, como sempre. Nomes importantes dos quadrinhos europeus são os autores destes álbuns, a exemplo do suíço Bernard Cosey, dos franceses Nicolas Keramidas, Tebo (Frédéric Thébault), Régis Loisel e Lewis Trodndheim, além dos italianos Fabrizio Petrossi e Federico Bertolucci. Os álbuns editados pela Glénat têm um acabamento requintado e as narrativas e as artes fogem do convencional e, com os artistas listados acima, os desenhos são mais sofisticados ou simplificados e até têm o mesmo tratamento dos comix underground. No Brasil, a publicação desta série  fica a cargo da editora Panini.

Por fim, a editora Universo dos Livros coloca à disposição dos leitores a quadrinização de desenhos da Disney ou da Pixar, como graphic novels ou no estilo de mangá: A Bela e a Fera, Cruella de Vil, Descendentes, Encanto, Red – Crescer é uma fera, Elementos, entre outros títulos, que, normalmente, são destinados principalmente para o público-juvenil.

Prof. Dr. Roberto Elísio dos Santos

quinta-feira, 7 de dezembro de 2023

Texto de pesquisador do Observatório é utilizado em prova de Instituto Federal


Recentemente, o Instituto Federal Fluminense da cidade de Macaé realizou prova para seleção de novos alunos. Na prova de português, o principal texto utilizado foi uma resenha elaborada pelo professor Roberto Elísio dos Santos, intitulada "A maioria da população brasileira é minoria nos quadrinhos".

O artigo do professor Roberto foi originalmente publicado no primeiro fascículo do volume 8 da revista 9a Arte, versando sobre a representatividade do negro nas histórias em quadrinhos brasileiras, tema do livro que foi o objeto da resenha, intitulado O negro nos quadrinhos do Brasil.

De autoria de Nobu Chinen, também pesquisador do Observatório, o livro foi publicado pela Editora Peirópolis, de São Paulo, em 2019, tendo sido resultado de sua pesquisa de doutoramento, realizada na Escola de Comunicações e Artes da USP. O livro foi originalmente distribuído aos participantes das Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos de 2019, mas pode ser encontrado em boas livrarias ou adquirido diretamente com a editora (Home - Editora Peirópolis (editorapeiropolis.com.br).

Ficamos sempre muito felizes pela apropriação de textos publicados na revista 9a Arte por instituições de ensino do país. 

A resenha pode ser acessada no endereço A Maioria da população brasileira é minoria nos quadrinhos | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br)

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

Professor Gilson Schwartz no Colóquio Científico do Observatório de Histórias em Quadrinhos


No próximo Colóquio Científico do Observatório de Histórias em Quadrinhos da Escola de Comunicações e Artes da USP (ECA-USP), que ocorrerá no dia 15 de dezembro de 2023, teremos a participação do Prof. Dr. Gilson Schwartz, que ministrará palestra sobre "O impacto da Inteligência Artificial (IA) na elaboração de produtos da cultura pop" aos pesquisadores/participantes do Observatório e demais interessados no assunto. 

O tema chamou a atenção dos pesquisadores e da mídia em geral devido às repercussões da eliminação de um indicado ao Prêmio Jabuti na categoria Quadrinhos pelo uso de IA para elaborar sua obra. Nesse sentido, o Prof. Gilson Schwartz, docente do Departamento de Cinema, Rádio e TV da Escola de Comunicações e Artes da USP, onde ministra a disciplina de pós-graduação "Economia da Informação e Novas Mídias", devido a seu extenso conhecimento e experiência na área, é a melhor pessoa para trazer esclarecimento e orientação sobre o tema.

O Colóquio Científico de dezembro será realizado na sala 293 do Departamento de Informação e Cultura da ECA-USP, das 19h30 às 22h00. Será um evento híbrido, também com transmissão e acesso pela internet. Ao final do evento, será realizada a confraternização de final de ano entre os presentes, com a realização do tradicional "Amigo Supersecreto". Aos interessados em participar do "Amigo Supersecreto", basta levar uma revista/álbum/livro de histórias em quadrinhos para ser sorteado durante a confraternização.

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

quarta-feira, 6 de dezembro de 2023

Cyberpunk no mangá



Cyberpunk é tudo igual? A resposta para essa pergunto, pelo menos por parte daqueles que, como eu, podem ser considerados como "leigos" nessa temática, provavelmente seria positiva. No entanto, não é o que acha João Marciano Neto, mestrando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Midiática da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação da Universidade Estadual Paulista (UNESP). 

Em seu artigo, "Foucault e Freud no ethos cyberpunk de Kanshikan Tsunemori Akane", recém-publicado no dossiê especial das 7as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos, da revista 9a Arte, Marciano Neto, partindo dos conceitos de hibridação e transculturação debatidos por Iwabuchi, Tatsumi e Ianni, realiza uma análise discursiva do mangá Inspector Akane Tsunemori e investiga a hipótese de um ethos próprio do cyberpunk japonês

Para realização dessa pesquisa, o autor recorre ao conceito de biopoder de Michel Foucault para compreender as diferenças de abordagem da cibernética de Wiener presentes no cyberpunk e, por fim, as teorias psicanalíticas de Freud, auxiliadas com as de Kawai, para entender a mudança do perfil do protagonista cyberpunk e a alegoria presente no mangá.

O artigo está disponível para leitura e download no endereço Foucault e Freud no ethos cyberpunk de Kanshikan Tsunemori Akane | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

terça-feira, 5 de dezembro de 2023

Os (des)limites do layout regular



Com o título acima, Caetano Galindo Borges, doutorando no Programa de Pós-Graduação em Artes da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais (EBA/UFMG) trata do uso dos espaços vazios na página de quadrinhos a partir da sua materialidade. Salienta, no entanto, que não se refere às sarjetas,  ou seja, o espaço em branco entre um quadrinho e outro, elemento regular da maioria das histórias em quadrinhos. Propõe-se, isso sim, a entender como esses espaços podem ser usados de forma a influir nas dinâmicas visuais e narrativas da página. Nesse sentido, propõe um recorte a partir do conceito de layout regular (Groensteen, 2015, p.103) e como esses espaços deixados em branco podem influenciar esse layout.

Conjugando teoria visual e artrologia, o autor realiza um estudo de caso tendo como base a obra Hedra, de Jesse Lonergan. Seu objetivo é mostrar como a omissão de quadros, criando espaços vazios, permite manipular a composição da página sem romper totalmente com a estrutura fixa que o layout regular propõe. Para chegar a essa conclusão, entende que existe uma dinâmica de expectativas cumpridas e subvertidas onde o espaço vazio torna-se elemento retórico e poético.

Trata-se de um texto instigante e audacioso, que levanta questionamentos válidos e necessários sobre a linguagem e funcionamento das histórias em quadrinhos, ajudando a melhor compreendê-la. Ele pode ser acessado no site da revista 9a Arte, no endereço Os (des)limites do layout regular | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

quinta-feira, 30 de novembro de 2023

Uso de quadrinhos em trabalhos acadêmicos - Parte 3

(Imagem disponível em: O Que São Direitos Autorais? | AutoriaFacil.com. Acesso em: 30 nov. 2023)

Ao pretender utilizar imagens de histórias em quadrinhos em um texto acadêmico, deve-se estar atento aos objetivos de uso daquela imagem específica. Nesse sentido, é importante perguntar se ela é realmente necessária e o quanto contribui para os objetivos do texto. Se a resposta for positiva, inclui-se a imagem. 

Uma segunda questão envolve a quantidade e diversidade de figuras utilizadas. São todas de um mesmo autor, de uma mesma obra?  A concentração em um autor ou obra é justificável quando ele ou ela são o objeto da pesquisa - um trabalho acadêmico sobre a personagem Mônica, de Maurício de Sousa, certamente vai pedir a inclusão de quadrinhos de que ela participe. A utilizaçao de quadrinhos de diversos autores no texto acadêmico é um demonstrativo de que a reprodução em si não é o objetivo principal que está sendo buscado.

A utilização de imagens de histórias em quadrinhos não isenta o autor do texto acadêmico de indicar a fonte da figura e incluir todos os dados bibliográficos da obra original. Cada imagem precisa ser identificada, informando-se onde está disponível, de que obra foi retirada e quem é o seu autor. O direito moral do autor da história em quadrinhos - o de ter sua autoria reconhecida -, é uma questão indiscutível a ser respeitada e preservada pela pesquisa acadêmica. Especialmente - e eu diria até: mais, ainda -, pelos que se dedicam às histórias em quadrinhos.

Pode-se também falar de níveis de utilização que talvez orientem ou tragam mais tranquilidade quanto à utilização de quadrinhos nas obras acadêmicas. Um trabalho de conclusão de curso de graduação, por exemplo, tem uma circulação restrita e dificilmente causaria grande repercussão. É improvável que algum autor vá se sentir lesado pela utilização de sua obra em uma produção desse tipo - pode até se sentir lisonjeado. Dissertações de mestrado e teses de doutorado ainda têm a mesma restrição de circulação, mas seu impacto na comunidade acadêmica, em princípio, é maior. Dependendo do tom e nível de crítica utilizados, podem causar desconforto aos autores. Artigos científicos elaborados a partir de produções acadêmicas ampliam o âmbito de circulação do texto original e podem chamar mais atenção, com impacto difícil de ser dimensionado a priori. A publicação de obras acadêmicas em formato livro exige maior atenção quanto à questão dos direitos autorais e os editores costumam ser mais zelosos a respeito disso. 

Por outro lado, mesmo considerando a "gradação" mencionada, tão importante quanto lançar mão das possibilidades legais para utilizar quadrinhos em textos acadêmicos, a regra do bom senso deve prevalecer: na dúvida, não utilize - peça autorização. Se o número de imagens de um mesmo autor parece exorbitante ou se o texto pode prejudicar o potencial econômico da obra original, o melhor a fazer é entrar em contato com o detentor dos direitos autorais e submeter-se à sua vontade. Nesse sentido, é importante ter em mente que isso significa um compromisso: se pedir autorização para usar, tem que seguir o que o autor disser

Devidamente considerada, acredito que a utilização de imagens de quadrinhos em textos acadêmicos pode conviver harmoniosamente com os direitos dos autores.

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro


Uso de quadrinhos em trabalhos acadêmicos - Parte 2

(Imagem disponível em: Vinte anos da lei de Direito Autoral no Brasil - GEDAI. Acesso em 30 nov. 2023.)

Ao mesmo tempo em que determina a obrigatoriedade de autorização prévia do autor para utilização de sua obra, definindo as modalidades em que tal uso pode ocorrer, a Lei 9.610 também indica algumas situações em que essa utilização pode ocorrer sem constituir ofensa aos direitos autorais - e, por consequência, sem necessidade da aquiescência prévia do autor. Isto ocorre em dois incisos do artigo 46.

No primeiro, inciso III, é definido que não constitui ofensa aos direitos autorais "a citação em livros, jornais, revistas ou qualquer outro meio de comunicação, de passagens de qualquer obra, para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim a atingir, indicando-se o nome do autor e a origem da obra". No segundo caso, inciso VIII, menciona-se que não chega tampouco a constituir ofensa "a reprodução, em quaisquer obras, de pequenos trechos de obras preexistentes, de qualquer natureza, ou de obra integral, quando de artes plásticas, sempre que a reprodução em si não seja o objetivo principal da obra nova e que não prejudique a exploração normal da obra reproduzida nem cause um prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores"

Sem entrar no âmbito das discussões jurídicas, que não é meu objetivo aqui, pode-se depreender que é possível utilizar quadrinhos em obras acadêmicas - ou seja, "para fins de estudo, crítica ou polêmica" -, sem com isso causar prejuízo aos direitos do autor. Nesse sentido, não é difícil perceber que a grande maioria das utilizações de imagens de histórias em quadrinhos em textos acadêmicos enquadra-se na categoria de uma citação, visando complementar, exemplificar ou ilustrar, com o próprio texto original - no caso, uma imagem de história em quadrinhos -, o raciocínio de quem elabora o texto. Afinal, se é facultado citar um texto escrito, por que não se poderia aplicar o mesmo raciocínio a um ou mais quadrinhos, a uma tira, a um cartum, a uma charge ou mesmo a parte de um quadrinho (como um balão, um close da figura retratada ou uma onomatopeia)? 

O inciso VIII trata ainda mais diretamente dos quadrinhos ao mencionar expressamente "artes plásticas", que são, no dizer da arte-educadora Laura Aidar, "toda expressão humana que transforma materiais em imagens e objetos com sentido artístico" (O que são Artes Plásticas - Significados). Também não é difícil concluir que entre essas "expressões" está a arte das histórias em quadrinhos.

Constituem esses dois incisos uma autorização prévia para utilizar imagens de histórias em quadrinhos em produções acadêmicas? Também não é assim. Mas eles, sem dúvida, apontam para a possibilidade de fazer isso com parcimônia e sem causar prejuízos ao detentor dos direitos autorais.

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

Uso de quadrinhos em trabalhos acadêmicos - Parte 1

(Disponível em: File:LeiAzeredo.gif - Wikimedia Commons. Acesso em: 30 nov. 2023)

Em um mundo ideal, seria interessante e desejável que toda e qualquer imagem de quadrinhos utilizada em qualquer texto, acadêmico ou não, fosse devidamente autorizada por seus autores ou pelos detentores de seus direitos autorais. O respeito ao direito autoral é uma prática salutar, que reconhece o esforço intelectuar e artístico, valoriza o processo criativo e garante o reconhecimento e devida compensação dos direitos de criação intelectual. Os pesquisadores e estudiosos, nesse sentido, na medida em que têm a produção de quadrinhos como objeto de sua atenção, devem ser os primeiros a reconhecer isso.

No mundo real, no entanto, nem sempre a sistemática acima mencionada é possível de ser seguida. Diversos fatores podem surgir que perturbam o processo de autorização do uso de imagens de quadrinhos em muitas obras. Dentre eles, podemos destacar o ritmo ou cadência da produção acadêmica, que obedece a prazos definidos e cujo não cumprimento de alguns deles pode significar prejuízos irreversíveis ao aluno ou pesquisador. Outro fator é o desconhecimento de como contatar ou a impossibilidade de realizar o contato com os detentores de direitos autorais, muitas vezes residentes em outros países. Acrescentam-se a isso as dificuldades burocráticas que muitas vezes envolvem a busca da autorização de uso, impostas principalmente por grandes conglomerados editoriais e seus advogados, zelosos em garantir a proteção de seu investimento financeiro. Finalmente, pode-se destacar como limitação o próprio custo-benefício envolvido no desenvolvimento de um longo e cansativo processo de solicitação, que às vezes envolve poucas ou apenas uma única imagem. Será que vale a pena o esforço? Não seria melhor concentrar o esforço na pesquisa propriamente dita e abrir mão do uso da imagens específicas, ainda que o resultado final sofra com isso? Ou seria preferível, talvez, arriscar um pouco e utilizar uma imagem sem autorização, consciente de que o objetivo de avanço do conhecimento está acima dessas questões?

Os estudiosos de histórias em quadrinhos muitas vezes se perguntam até onde podem ir no uso de imagens de produções quadrinísticas em seus trabalhos acadêmicos sem que haja necessidade de solicitar a autorização dos autores. Quanto a isso, não há uma resposta fácil. A Lei 9.610, de 19 de fevereiro de 1998 (L9610 (planalto.gov.br)), que altera, atualiza e consolida a questão dos direitos autorais no Brasil, é bastante minuciosa e detalha o que pode e não pode ser feito nessa área. Ela, inclusive, diz textualmente, em seus artigos 28 e 29 que "cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica" e que "depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades". 

Evidentemente, a Lei existe para ser cumprida. Mas isso - dirão -, inviabiliza o uso de quadrinhos nas produções acadêmica!. Felizmente, não é bem assim. 

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

quarta-feira, 29 de novembro de 2023

Questões de tradução em Batman: the killing joke



A tradução de histórias em quadrinhos nem sempre é uma tarefa simples, muitas vezes dando motivo para discussão e o levantamento de aspectos polêmicos. Em seu artigo, publicado hoje no dossiê das 7as Jornadas Internacionais de Histórias em QuadrinhosLuiz Ricardo Gonsalez Micheletti, graduando do curso de Letras Português-Espanhol pela Universidade Federal de São Carlos aborda mais um desses aspectos, pretendendo mostrar como a tradução ou falta da mesma altera ou preserva a caracterização das personagens.  

O corpus da pesquisa é formado pela obra original e três versões de tradução para o português brasileiro dgraphic novel Batman: the killing joke.  Para a análise, foram utilizadas as modalidades de tradução de Aubert (1998), tendo como recorte a modalidade ‘omissão’

O artigo destaca como a falta de tradução ou modificações em determinados trechos levam à descaracterização das personagens, mais especificamente Barbara Gordon e Coringa, ao se comparar duas traduções da Editora Abril e uma tradução da Editora Panini com a versão original. Foram considerados os contextos de produção, publicação e recepção das obras no mercado brasileiro. Assim, o autor chegou à conclusão de que a omissão ou alteração de segmentos do texto original descaracteriza as personagens ao excluir total ou parcialmente traços de personalidade que poderiam auxiliar o leitor a entender melhor suas complexidades, além de haver a perda do "entrelaçamento" (Groensteen, 2015) no decorrer de alguns trechos das traduções. 

Intitulado "HQ, tradução e personagem: reflexoes a partir de Batman: the killing joke", o artigo pode ser acessado no endereço HQ, tradução e personagem | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

segunda-feira, 27 de novembro de 2023

Protagonismo indígena e divulgação científica em quadrinhos



O protagonismo indígena é o foco central do mais recente artigo publicado no Dossiê das 7as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos, edição especial da revista 9a Arte

Em "Tem indígena aqui: reflexões acerca do protagonismo indígena na história em quadrinho da revista Almanaque Tem Cientista Aqui", as autoras Julia Melo Chohfi, Paola Susana Mendoza Champi e Sarah Marion Martins, todas da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), utilizam a base teórica da análise do discurso franco-brasileira para refletir sobre uma história em quadrinhos específica.

O artigo estabelece as relações da arte dos quadrinhos com a divulgação científica para o  público escolar, problematizando as discussões em torno do conhecimento científico e popular através da representatividade e protagonismo indígena. O objeto de análise é a história em quadrinhos "Quantas espécies de peixes existem na bacia amazônica?, publicada na revista Almanaque Tem Cientista Aqui!, da rede Conexões Amazônicas, publicada em novembro de 2022.

Produzida no âmbito da Oficina “Tem cientista aqui”, realizada em parceria com várias instituições, a revista foi idealizada para ser utilizada com os estudantes do ensino fundamental, buscando aproximá-los ao cotidiano dos pesquisadores que estudam a Amazônia nas áreas de arqueologia, recursos hídricos, ecologia e sociologia. A protagonista da história é uma menina indígena que aparece retratada em vários momentos de sua vida. Aplicando as ferramentas da análise do discurso, as autoras conseguem identificar que o material produzido, ainda que buscando empoderar e valorizar a comunidade indígena, apresenta algumas limitações que engrandecem e hegemonizam “o conhecimento científico do homem branco eurocentrista” em detrimento a outros tipos de conhecimentos.

O artigo está disponível para leitura e download em Tem indígena aqui: | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

quinta-feira, 23 de novembro de 2023

O toma lá dá cá dos crossovers



Na metade dos anos 1970, a fábrica de brinquedos Gulliver colocou à venda uma caixa com bonequinhos de plástico com heróis como Batman e Robin, Capitão América, o Zorro de capa e espada, entre outros. Para um pré-adolescente fã de quadrinhos, este tesouro, infelizmente perdido no tempo, fazia a imaginação transbordar de narrativas diferentes protagonizadas pelos personagens que, naquela época, não se misturavam nos gibis. Era o primeiro crossover, embora não envolvesse quadrinhos e este termo ainda fosse desconhecido, pelo menos no Brasil.

Mas foi no final daquela década que o sonho dos leitores começou a se tornar realidade. As rivais Marvel e DC Comics se uniram - depois de fazerem juntas a adaptação para os quadrinhos de O Mágico de Oz - e publicaram dois encontros do Superman com o Homem-Aranha, um em que Batman tenta ajudar outro Bruce (o que se transforma no Incrível Hulk), além dos campeões de vendagem das duas casas no início dos anos 1980, X-Men e Novos Titãs. Por isso, reuniões de super-heróis de ambas editoras passaram a ser mais frequentes, ganhando spin-offs e um grande evento: um arco narrativo gigantesco que culminou na separação dos dois universos... até agora. Cada uma das majors estadunidenses cuidava de uma edição. Trata-se, é óbvio, de um lance de marketing e uma forma de incrementar as vendas. Mesmo assim, os fãs não se importaram e compraram inclusive edições com várias histórias fracas.

Pronto! Havia sido dada a largada para a permutação de personagens de diferentes editoras e universos não compartilhados. Além dos quadrinhos, essa hibridação ganhou as telas de cinema e das TVs (com as fitas de vídeo cassete bastante pirateadas) com o longa animado Uma cilada para Roger Rabbitt. Lançada em 1988, com direção de Robert Zemeckis, essa produção contou com a associação dos estúdios Disney, Amblin, Touchstone, etc. Personagens como Mickey e Pernalonga, Pato Donald e Patolino apareciam juntos e o filme contava ainda com a participação do cão Soneca (Droopy), do Lobo criado por Tex Avery e de Betty Boop, a melindrosa cantora de Jazz.

Como os crossovers vendiam muitas revistas e minisséries, os editores produziram alguns bem inusitados: Batman/Hortelino Trocaletra, Superman/Aliens, Archie/Predador, Quarteto Fantástico/Gen 13, Star Trek/X-Men (com dois doutores McCoy), entre muitos outros. Mais recentemente, a editora estadunidense Dynamite lançou Tarzan/Red Sonja, Groo meets Tarzan e Tarzan of the Apes/Planet of Apes. No Brasil, em 2001, Watson Portela, Franco de Rosa e outros artistas nacionais agruparam vários personagens – Mirza, Mylar, Pele de Cobra, Superargo etc. - criados por Eugênio Colonnese na graphic novel A última missão, que saiu pelo selo Graphic Brasil da Editora Opera Graphica. Até a Turma da Mônica contracenou com a Liga da Justiça e o gato Garfield nos quadrinhos e com o Menino Maluquinho e seus amigos, concebidos por Ziraldo, em dois livros ilustrados. O que ainda falta? Afinal, o mercado editorial é formado por vários universos e a fome dos leitores é insaciável.

Prof. Dr. Roberto Elísio dos Santos

segunda-feira, 20 de novembro de 2023

Mangás e Doramas

 


O boys’ love é um gênero que nasceu no mangá, passou pelo anime e hoje e vem ganhando as telas através dos doramas. Um dos principais expoentes do gênero nesse formato no Japão é a obra Cherry magic!

Buscando fazer uma uma análise comparativa dessa obra entre suas versões em quadrinhos e a série televisiva, Paulo Henrique Testoni, da Universidade do Sul de Santa Catarina, apresentou nas 7as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos o trabalho "Diferenças entre o gênero boys’ love no mangá e nos doramas através da obra Cherry Magic!". Transposto para artigo científico, o texto pode agora ser apreciado no dossiê especial da revista 9a Arte, dedicado ao evento.

No artigo, Testoni reporta recentes conversas sobre o fato de as versões live action do gênero boy´s love terem uma aproximação maior com a realidade gay em detrimento às suas versões em mangá e anime. O que foi possível ser observado até então é que a estética dos protagonistas, na versão mangá, se enquadra muito mais no estereótipo de seme (másculo e viril) e uke (delicado e afeminado) do que a versão para televisão. No artigo, todos esses aspectos são discutidos por meio da análise das versões de Cherry Magic!. Sua leitura permitirá obter conhecimento acerca das mudanças que o gênero sofre ao ganhar adaptações live action.

O artigo está disponível em Diferenças entre o gênero boys’ love no mangá e nos doramas através da obra Cherry Magic! | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

domingo, 19 de novembro de 2023

Análise crítica de Cinema Panopticum

 


No artigo "Cinema Panopticum, de Thomas Ott: imagens, terror e controle social", Pascoal Farinaccio, da Universidade Federal Fluminense, propõe a análise crítica dessa história em quadrinhos de Thomas Ott, publicada em 2021. 

Na narrativa, uma garota visita um parque de diversões onde assiste a pequenos filmes em cabines de cinetoscópio (um aparelho de projeção de imagens inventado em 1894). Pelos  olhos da garota, o leitor acompanha, nos filmes, histórias macabras e cruéis. Inicialmente, o artigo se debruça sobre o conceito de panóptico, estudado por Michel Foucault (2014), para estabelecer uma relação entre o universo das imagens e o controle social. Na sequência, busca esclarecer, com apoio em teorias do cinema, o diálogo criativo de Thomas Ott com o cinema expressionista alemão e sua atmosfera de terror

Ao final do artigo, demonstra-se como Ott recupera algo do fascínio e temor dos primeiros espectadores em face das imagens cinematográficas.

O artigo, publicado no dossiê especial da revista 9a Arte, é um dos vários apresentados nas 7as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos, realizadas em agosto de 2023 na Escola de Comunicações e Artes da USP. Ele pode ser lido na íntegra no endereço Cinema Panopticum, de Thomas Ott: | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro