quinta-feira, 30 de novembro de 2023

Uso de quadrinhos em trabalhos acadêmicos - Parte 3

(Imagem disponível em: O Que São Direitos Autorais? | AutoriaFacil.com. Acesso em: 30 nov. 2023)

Ao pretender utilizar imagens de histórias em quadrinhos em um texto acadêmico, deve-se estar atento aos objetivos de uso daquela imagem específica. Nesse sentido, é importante perguntar se ela é realmente necessária e o quanto contribui para os objetivos do texto. Se a resposta for positiva, inclui-se a imagem. 

Uma segunda questão envolve a quantidade e diversidade de figuras utilizadas. São todas de um mesmo autor, de uma mesma obra?  A concentração em um autor ou obra é justificável quando ele ou ela são o objeto da pesquisa - um trabalho acadêmico sobre a personagem Mônica, de Maurício de Sousa, certamente vai pedir a inclusão de quadrinhos de que ela participe. A utilizaçao de quadrinhos de diversos autores no texto acadêmico é um demonstrativo de que a reprodução em si não é o objetivo principal que está sendo buscado.

A utilização de imagens de histórias em quadrinhos não isenta o autor do texto acadêmico de indicar a fonte da figura e incluir todos os dados bibliográficos da obra original. Cada imagem precisa ser identificada, informando-se onde está disponível, de que obra foi retirada e quem é o seu autor. O direito moral do autor da história em quadrinhos - o de ter sua autoria reconhecida -, é uma questão indiscutível a ser respeitada e preservada pela pesquisa acadêmica. Especialmente - e eu diria até: mais, ainda -, pelos que se dedicam às histórias em quadrinhos.

Pode-se também falar de níveis de utilização que talvez orientem ou tragam mais tranquilidade quanto à utilização de quadrinhos nas obras acadêmicas. Um trabalho de conclusão de curso de graduação, por exemplo, tem uma circulação restrita e dificilmente causaria grande repercussão. É improvável que algum autor vá se sentir lesado pela utilização de sua obra em uma produção desse tipo - pode até se sentir lisonjeado. Dissertações de mestrado e teses de doutorado ainda têm a mesma restrição de circulação, mas seu impacto na comunidade acadêmica, em princípio, é maior. Dependendo do tom e nível de crítica utilizados, podem causar desconforto aos autores. Artigos científicos elaborados a partir de produções acadêmicas ampliam o âmbito de circulação do texto original e podem chamar mais atenção, com impacto difícil de ser dimensionado a priori. A publicação de obras acadêmicas em formato livro exige maior atenção quanto à questão dos direitos autorais e os editores costumam ser mais zelosos a respeito disso. 

Por outro lado, mesmo considerando a "gradação" mencionada, tão importante quanto lançar mão das possibilidades legais para utilizar quadrinhos em textos acadêmicos, a regra do bom senso deve prevalecer: na dúvida, não utilize - peça autorização. Se o número de imagens de um mesmo autor parece exorbitante ou se o texto pode prejudicar o potencial econômico da obra original, o melhor a fazer é entrar em contato com o detentor dos direitos autorais e submeter-se à sua vontade. Nesse sentido, é importante ter em mente que isso significa um compromisso: se pedir autorização para usar, tem que seguir o que o autor disser

Devidamente considerada, acredito que a utilização de imagens de quadrinhos em textos acadêmicos pode conviver harmoniosamente com os direitos dos autores.

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro


Uso de quadrinhos em trabalhos acadêmicos - Parte 2

(Imagem disponível em: Vinte anos da lei de Direito Autoral no Brasil - GEDAI. Acesso em 30 nov. 2023.)

Ao mesmo tempo em que determina a obrigatoriedade de autorização prévia do autor para utilização de sua obra, definindo as modalidades em que tal uso pode ocorrer, a Lei 9.610 também indica algumas situações em que essa utilização pode ocorrer sem constituir ofensa aos direitos autorais - e, por consequência, sem necessidade da aquiescência prévia do autor. Isto ocorre em dois incisos do artigo 46.

No primeiro, inciso III, é definido que não constitui ofensa aos direitos autorais "a citação em livros, jornais, revistas ou qualquer outro meio de comunicação, de passagens de qualquer obra, para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim a atingir, indicando-se o nome do autor e a origem da obra". No segundo caso, inciso VIII, menciona-se que não chega tampouco a constituir ofensa "a reprodução, em quaisquer obras, de pequenos trechos de obras preexistentes, de qualquer natureza, ou de obra integral, quando de artes plásticas, sempre que a reprodução em si não seja o objetivo principal da obra nova e que não prejudique a exploração normal da obra reproduzida nem cause um prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores"

Sem entrar no âmbito das discussões jurídicas, que não é meu objetivo aqui, pode-se depreender que é possível utilizar quadrinhos em obras acadêmicas - ou seja, "para fins de estudo, crítica ou polêmica" -, sem com isso causar prejuízo aos direitos do autor. Nesse sentido, não é difícil perceber que a grande maioria das utilizações de imagens de histórias em quadrinhos em textos acadêmicos enquadra-se na categoria de uma citação, visando complementar, exemplificar ou ilustrar, com o próprio texto original - no caso, uma imagem de história em quadrinhos -, o raciocínio de quem elabora o texto. Afinal, se é facultado citar um texto escrito, por que não se poderia aplicar o mesmo raciocínio a um ou mais quadrinhos, a uma tira, a um cartum, a uma charge ou mesmo a parte de um quadrinho (como um balão, um close da figura retratada ou uma onomatopeia)? 

O inciso VIII trata ainda mais diretamente dos quadrinhos ao mencionar expressamente "artes plásticas", que são, no dizer da arte-educadora Laura Aidar, "toda expressão humana que transforma materiais em imagens e objetos com sentido artístico" (O que são Artes Plásticas - Significados). Também não é difícil concluir que entre essas "expressões" está a arte das histórias em quadrinhos.

Constituem esses dois incisos uma autorização prévia para utilizar imagens de histórias em quadrinhos em produções acadêmicas? Também não é assim. Mas eles, sem dúvida, apontam para a possibilidade de fazer isso com parcimônia e sem causar prejuízos ao detentor dos direitos autorais.

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

Uso de quadrinhos em trabalhos acadêmicos - Parte 1

(Disponível em: File:LeiAzeredo.gif - Wikimedia Commons. Acesso em: 30 nov. 2023)

Em um mundo ideal, seria interessante e desejável que toda e qualquer imagem de quadrinhos utilizada em qualquer texto, acadêmico ou não, fosse devidamente autorizada por seus autores ou pelos detentores de seus direitos autorais. O respeito ao direito autoral é uma prática salutar, que reconhece o esforço intelectuar e artístico, valoriza o processo criativo e garante o reconhecimento e devida compensação dos direitos de criação intelectual. Os pesquisadores e estudiosos, nesse sentido, na medida em que têm a produção de quadrinhos como objeto de sua atenção, devem ser os primeiros a reconhecer isso.

No mundo real, no entanto, nem sempre a sistemática acima mencionada é possível de ser seguida. Diversos fatores podem surgir que perturbam o processo de autorização do uso de imagens de quadrinhos em muitas obras. Dentre eles, podemos destacar o ritmo ou cadência da produção acadêmica, que obedece a prazos definidos e cujo não cumprimento de alguns deles pode significar prejuízos irreversíveis ao aluno ou pesquisador. Outro fator é o desconhecimento de como contatar ou a impossibilidade de realizar o contato com os detentores de direitos autorais, muitas vezes residentes em outros países. Acrescentam-se a isso as dificuldades burocráticas que muitas vezes envolvem a busca da autorização de uso, impostas principalmente por grandes conglomerados editoriais e seus advogados, zelosos em garantir a proteção de seu investimento financeiro. Finalmente, pode-se destacar como limitação o próprio custo-benefício envolvido no desenvolvimento de um longo e cansativo processo de solicitação, que às vezes envolve poucas ou apenas uma única imagem. Será que vale a pena o esforço? Não seria melhor concentrar o esforço na pesquisa propriamente dita e abrir mão do uso da imagens específicas, ainda que o resultado final sofra com isso? Ou seria preferível, talvez, arriscar um pouco e utilizar uma imagem sem autorização, consciente de que o objetivo de avanço do conhecimento está acima dessas questões?

Os estudiosos de histórias em quadrinhos muitas vezes se perguntam até onde podem ir no uso de imagens de produções quadrinísticas em seus trabalhos acadêmicos sem que haja necessidade de solicitar a autorização dos autores. Quanto a isso, não há uma resposta fácil. A Lei 9.610, de 19 de fevereiro de 1998 (L9610 (planalto.gov.br)), que altera, atualiza e consolida a questão dos direitos autorais no Brasil, é bastante minuciosa e detalha o que pode e não pode ser feito nessa área. Ela, inclusive, diz textualmente, em seus artigos 28 e 29 que "cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica" e que "depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades". 

Evidentemente, a Lei existe para ser cumprida. Mas isso - dirão -, inviabiliza o uso de quadrinhos nas produções acadêmica!. Felizmente, não é bem assim. 

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

quarta-feira, 29 de novembro de 2023

Questões de tradução em Batman: the killing joke



A tradução de histórias em quadrinhos nem sempre é uma tarefa simples, muitas vezes dando motivo para discussão e o levantamento de aspectos polêmicos. Em seu artigo, publicado hoje no dossiê das 7as Jornadas Internacionais de Histórias em QuadrinhosLuiz Ricardo Gonsalez Micheletti, graduando do curso de Letras Português-Espanhol pela Universidade Federal de São Carlos aborda mais um desses aspectos, pretendendo mostrar como a tradução ou falta da mesma altera ou preserva a caracterização das personagens.  

O corpus da pesquisa é formado pela obra original e três versões de tradução para o português brasileiro dgraphic novel Batman: the killing joke.  Para a análise, foram utilizadas as modalidades de tradução de Aubert (1998), tendo como recorte a modalidade ‘omissão’

O artigo destaca como a falta de tradução ou modificações em determinados trechos levam à descaracterização das personagens, mais especificamente Barbara Gordon e Coringa, ao se comparar duas traduções da Editora Abril e uma tradução da Editora Panini com a versão original. Foram considerados os contextos de produção, publicação e recepção das obras no mercado brasileiro. Assim, o autor chegou à conclusão de que a omissão ou alteração de segmentos do texto original descaracteriza as personagens ao excluir total ou parcialmente traços de personalidade que poderiam auxiliar o leitor a entender melhor suas complexidades, além de haver a perda do "entrelaçamento" (Groensteen, 2015) no decorrer de alguns trechos das traduções. 

Intitulado "HQ, tradução e personagem: reflexoes a partir de Batman: the killing joke", o artigo pode ser acessado no endereço HQ, tradução e personagem | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

segunda-feira, 27 de novembro de 2023

Protagonismo indígena e divulgação científica em quadrinhos



O protagonismo indígena é o foco central do mais recente artigo publicado no Dossiê das 7as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos, edição especial da revista 9a Arte

Em "Tem indígena aqui: reflexões acerca do protagonismo indígena na história em quadrinho da revista Almanaque Tem Cientista Aqui", as autoras Julia Melo Chohfi, Paola Susana Mendoza Champi e Sarah Marion Martins, todas da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), utilizam a base teórica da análise do discurso franco-brasileira para refletir sobre uma história em quadrinhos específica.

O artigo estabelece as relações da arte dos quadrinhos com a divulgação científica para o  público escolar, problematizando as discussões em torno do conhecimento científico e popular através da representatividade e protagonismo indígena. O objeto de análise é a história em quadrinhos "Quantas espécies de peixes existem na bacia amazônica?, publicada na revista Almanaque Tem Cientista Aqui!, da rede Conexões Amazônicas, publicada em novembro de 2022.

Produzida no âmbito da Oficina “Tem cientista aqui”, realizada em parceria com várias instituições, a revista foi idealizada para ser utilizada com os estudantes do ensino fundamental, buscando aproximá-los ao cotidiano dos pesquisadores que estudam a Amazônia nas áreas de arqueologia, recursos hídricos, ecologia e sociologia. A protagonista da história é uma menina indígena que aparece retratada em vários momentos de sua vida. Aplicando as ferramentas da análise do discurso, as autoras conseguem identificar que o material produzido, ainda que buscando empoderar e valorizar a comunidade indígena, apresenta algumas limitações que engrandecem e hegemonizam “o conhecimento científico do homem branco eurocentrista” em detrimento a outros tipos de conhecimentos.

O artigo está disponível para leitura e download em Tem indígena aqui: | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

quinta-feira, 23 de novembro de 2023

O toma lá dá cá dos crossovers



Na metade dos anos 1970, a fábrica de brinquedos Gulliver colocou à venda uma caixa com bonequinhos de plástico com heróis como Batman e Robin, Capitão América, o Zorro de capa e espada, entre outros. Para um pré-adolescente fã de quadrinhos, este tesouro, infelizmente perdido no tempo, fazia a imaginação transbordar de narrativas diferentes protagonizadas pelos personagens que, naquela época, não se misturavam nos gibis. Era o primeiro crossover, embora não envolvesse quadrinhos e este termo ainda fosse desconhecido, pelo menos no Brasil.

Mas foi no final daquela década que o sonho dos leitores começou a se tornar realidade. As rivais Marvel e DC Comics se uniram - depois de fazerem juntas a adaptação para os quadrinhos de O Mágico de Oz - e publicaram dois encontros do Superman com o Homem-Aranha, um em que Batman tenta ajudar outro Bruce (o que se transforma no Incrível Hulk), além dos campeões de vendagem das duas casas no início dos anos 1980, X-Men e Novos Titãs. Por isso, reuniões de super-heróis de ambas editoras passaram a ser mais frequentes, ganhando spin-offs e um grande evento: um arco narrativo gigantesco que culminou na separação dos dois universos... até agora. Cada uma das majors estadunidenses cuidava de uma edição. Trata-se, é óbvio, de um lance de marketing e uma forma de incrementar as vendas. Mesmo assim, os fãs não se importaram e compraram inclusive edições com várias histórias fracas.

Pronto! Havia sido dada a largada para a permutação de personagens de diferentes editoras e universos não compartilhados. Além dos quadrinhos, essa hibridação ganhou as telas de cinema e das TVs (com as fitas de vídeo cassete bastante pirateadas) com o longa animado Uma cilada para Roger Rabbitt. Lançada em 1988, com direção de Robert Zemeckis, essa produção contou com a associação dos estúdios Disney, Amblin, Touchstone, etc. Personagens como Mickey e Pernalonga, Pato Donald e Patolino apareciam juntos e o filme contava ainda com a participação do cão Soneca (Droopy), do Lobo criado por Tex Avery e de Betty Boop, a melindrosa cantora de Jazz.

Como os crossovers vendiam muitas revistas e minisséries, os editores produziram alguns bem inusitados: Batman/Hortelino Trocaletra, Superman/Aliens, Archie/Predador, Quarteto Fantástico/Gen 13, Star Trek/X-Men (com dois doutores McCoy), entre muitos outros. Mais recentemente, a editora estadunidense Dynamite lançou Tarzan/Red Sonja, Groo meets Tarzan e Tarzan of the Apes/Planet of Apes. No Brasil, em 2001, Watson Portela, Franco de Rosa e outros artistas nacionais agruparam vários personagens – Mirza, Mylar, Pele de Cobra, Superargo etc. - criados por Eugênio Colonnese na graphic novel A última missão, que saiu pelo selo Graphic Brasil da Editora Opera Graphica. Até a Turma da Mônica contracenou com a Liga da Justiça e o gato Garfield nos quadrinhos e com o Menino Maluquinho e seus amigos, concebidos por Ziraldo, em dois livros ilustrados. O que ainda falta? Afinal, o mercado editorial é formado por vários universos e a fome dos leitores é insaciável.

Prof. Dr. Roberto Elísio dos Santos

segunda-feira, 20 de novembro de 2023

Mangás e Doramas

 


O boys’ love é um gênero que nasceu no mangá, passou pelo anime e hoje e vem ganhando as telas através dos doramas. Um dos principais expoentes do gênero nesse formato no Japão é a obra Cherry magic!

Buscando fazer uma uma análise comparativa dessa obra entre suas versões em quadrinhos e a série televisiva, Paulo Henrique Testoni, da Universidade do Sul de Santa Catarina, apresentou nas 7as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos o trabalho "Diferenças entre o gênero boys’ love no mangá e nos doramas através da obra Cherry Magic!". Transposto para artigo científico, o texto pode agora ser apreciado no dossiê especial da revista 9a Arte, dedicado ao evento.

No artigo, Testoni reporta recentes conversas sobre o fato de as versões live action do gênero boy´s love terem uma aproximação maior com a realidade gay em detrimento às suas versões em mangá e anime. O que foi possível ser observado até então é que a estética dos protagonistas, na versão mangá, se enquadra muito mais no estereótipo de seme (másculo e viril) e uke (delicado e afeminado) do que a versão para televisão. No artigo, todos esses aspectos são discutidos por meio da análise das versões de Cherry Magic!. Sua leitura permitirá obter conhecimento acerca das mudanças que o gênero sofre ao ganhar adaptações live action.

O artigo está disponível em Diferenças entre o gênero boys’ love no mangá e nos doramas através da obra Cherry Magic! | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

domingo, 19 de novembro de 2023

Análise crítica de Cinema Panopticum

 


No artigo "Cinema Panopticum, de Thomas Ott: imagens, terror e controle social", Pascoal Farinaccio, da Universidade Federal Fluminense, propõe a análise crítica dessa história em quadrinhos de Thomas Ott, publicada em 2021. 

Na narrativa, uma garota visita um parque de diversões onde assiste a pequenos filmes em cabines de cinetoscópio (um aparelho de projeção de imagens inventado em 1894). Pelos  olhos da garota, o leitor acompanha, nos filmes, histórias macabras e cruéis. Inicialmente, o artigo se debruça sobre o conceito de panóptico, estudado por Michel Foucault (2014), para estabelecer uma relação entre o universo das imagens e o controle social. Na sequência, busca esclarecer, com apoio em teorias do cinema, o diálogo criativo de Thomas Ott com o cinema expressionista alemão e sua atmosfera de terror

Ao final do artigo, demonstra-se como Ott recupera algo do fascínio e temor dos primeiros espectadores em face das imagens cinematográficas.

O artigo, publicado no dossiê especial da revista 9a Arte, é um dos vários apresentados nas 7as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos, realizadas em agosto de 2023 na Escola de Comunicações e Artes da USP. Ele pode ser lido na íntegra no endereço Cinema Panopticum, de Thomas Ott: | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

sexta-feira, 17 de novembro de 2023

Como ensinar a leitura crítica de quadrinhos


 

Pode-se dizer que o artigo de Lucas Piter Alves Costa, Mayara Victoria dos Santos Oliveira e Artur Schitine Siqueira Rodrigues, intitulado "Sequências didáticas para ensino e avaliação de leitura de quadrinhos", parte, no mínimo, de uma premissa ousada: é possível ensinar e avaliar a leitura crítica de histórias em quadrinhos.


Com esse objetivo em mente, os autores buscam propor uma sequência didática para o ensino e avaliação de leitura crítica de quadrinhos, atendendo a algumas habilidades previstas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC). A metodologia utilizada para isso tem sua base na Análise do Discurso Semiolinguística (Charandeau, 2008), com apropriações teóricas de Ramos (2009), Groensteen (2015), Joly (2007), Kleiman (2002), Dell’Isola (1996), Dolz, Noverraz, Schneuwly (2004). 


O material usado para a sequência didática é uma charge de autoria de Mau, pseudônimo do cartunista Maurício Jorge, também conhecido como “Jorge O Mau” (cartunista, chargista, quadrinista, tatuador e ilustrador). Os autores defendem que o percurso de leitura tem como fim não apenas a compreensão, mas a significação do mundo. Os resultados sugerem que trabalhar leitura de quadrinhos nas escolas ainda é um desafio, devido à falta de familiaridade com o sistema semiótico desses gêneros.


Com uma proposta tão instigante, o artigo certamente interessa a todos que desejam se aprofundar em aspectos da leitura crítica de quadrinhos. Publicado no dossiê das 7as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos da revista 9a Arte, ele está disponível no endereço Sequências didáticas para ensino e avaliação de leitura de quadrinhos | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

quinta-feira, 16 de novembro de 2023

E a aventura continua... por outras mãos


 

Uma estratégia das editoras comerciais é a utilização de ghosts, artistas que auxiliam o quadrinista principal sem levar o crédito. Alguns são responsáveis apenas pelos desenhos de fundo, como paisagens e cenários. Will Eisner, um autor consagrado, contava com uma linha de produção com diversos profissionais. Jules Feiffer e Wally Wood, cartunistas que ganharam fama posteriormente, trabalharam no estúdio de Eisner ao lado de outros desconhecidos.

Personagens e histórias que sempre estiveram ligados a seus criadores originais passaram, após o falecimento desses artistas, para outras mãos que emulam o traço, os temas e as estruturas narrativas das histórias. É o caso de Carl Barks, cujo trabalho e estilo foram reproduzidos por Vicar e Daniel Branca e, mais recentemente, pelo brasileiro Carlos Mota. Alguns poucos artistas, porém, não permitiram que outros assumissem seu lugar, a exemplo de Hergé (Tintim) – que também contratava ghosts -, e de Bill Watterson (Calvin e Haroldo). Para os leitores que seguem o cânone, a segunda decisão é a mais correta, enquanto muitos fãs preferem que seus personagens preferidos sigam por novos caminhos.

Na Europa, inclusive, quadrinistas contemporâneos sucederam os artífices de personagens consagrados, a exemplo do caubói Lucky Luke, idealizado pelo belga Morris (pseudônimo de Maurice de Bévère), que agora tem suas aventuras produzidas principalmente por Achdé e Jul. As façanhas dos gauleses Astérix e Obelix, símbolos da França saídos da imaginação do roteirista René Goscinny e pelo desenhista Albert Uderzo, foram transferidas para Jean-Yves Ferri e Didier Conrad. Já o dândi Corto Maltese, concebido por Hugo Pratt, serve de inspiração para que os espenhóis Juan Díaz Canales e Rubén Pellejero continuem a trajetória do herói. Indagar qual são as melhores obras, a dos criadores ou dos seus seguidores, torna-se um debate infrutífero. O importante é verificar a qualidade desses trabalhos, os anteriores ou os atuais, tanto no que concerne ao estilo gráfico como às narrativas.

Prof. Dr. Roberto Elísio dos Santos

Artista e pesquisadora Paula Mastroberti discute o processo de criação de sua graphic novel



Em seu artigo, "Se Peter Pan é uma história (em quadrinhos) para meninas: relato de um processo criativo", a artista de pesquisadora Paula Mastroberti discute o processo de criação de uma narrativa gráfica em andamento. O artigo é derivado da pesquisa desenvolvida durante o mestrado e o doutorado em Letras na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, que teve como corpus a obra Peter and Wendy, de James M. Barrie, e suas edições e repercussões junto ao leitor brasileiro. 

No artigo, Mastroberti descreve os métodos e concepções que fundamentam Peter Pan: uma história de meninas, com três volumes, já divulgados em acesso livre online. A autora declara que seu principal objetivo é divulgar a obra em quadrinhos e refletir sobre o processo de produção autoral, levando em consideração a complexidade do sistema semiótico dos quadrinhos.

Ao descrever o processo de criação da graphic novel, a autora discorre sobre suas motivações e metodologia de trabalho, o argumento e principais conceitos que utilizou como guias, o desenvolvimento do roteiro, a construção artística da obra, os materiais utilizados e o uso dos recursos da linguagem dos quadrinhos

Pode-se dizer que o artigo apresenta quase que uma "radiografia" de uma produção quadrinística, chamando para aspectos nem sempre muito discutidos na literatura da área.

O artigo pode ser acessado no endereço Se Peter Pan é uma história (em quadrinhos) para meninas: | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

quarta-feira, 15 de novembro de 2023

Quadrinhos franceses e belgas - Parte 4


 f - Dos quadrinhos “franco-belgas” às distinções e diferenças nos quadrinhos belgas.

Tem havido tanto intercâmbio entre os quadrinhos belgas e franceses que muitas vezes se encontram referências a “quadrinhos franco-belgas”. O termo é conveniente, mas pode mascarar diferenças importantes entre os dois mercados nacionais (Baetens 2005, 2008; Lefèvre 2005; Bosque 2010: 123; Leroy 2010).

Mesmo os termos “quadrinhos franceses” ou os “quadrinhos belgas” podem omitir especificidades regionais ou provinciais. Tensões entre as capitais (Paris e Bruxelas) e as províncias já são visíveis dentro e ao redor dos quadrinhos de século XIX, nas viagens dos cartunistas e seus personagens das províncias para as capitais e às vezes de volta.

Distinções linguísticas, culturais, econômicas e artísticas entre os quadrinhos belgas em flamengo e os em francês são importantes para alguns fãs e estudiosos de quadrinhos belgas, enquanto os leitores franceses que não são da Bélgica muitas vezes desconhecem traços e diferenças nos quadrinhos incluindo a existência de uma tradição distinta de quadrinhos flamengos.

O termo “quadrinhos franco-belgas” também exclui ou ignora contribuições historicamente importantes de cartunistas suíços, como Topffer e Steinlen (nascido na Suíça e naturalizado francês), para quadrinhos na França e na Bélgica.

Paques (2012) e Lefevre (2009, 2011) também analisam as publicações standards (broadsheets) de banda desenhada belgas. Dupuis, Casterman e Gordinne, para quadrinhos em língua francesa, e Standaard, para quadrinhos em flamengo, têm sido grandes editores na Bélgica.

Lefevre (2005: 17) explica que as séries de quadrinhos francesas são frequentemente publicadas em capa dura no ritmo de um ou dois volumes por ano, enquanto os flamengos são publicados a uma taxa de três a cinco livros por ano. Ele observa que os volumes individuais flamengos podem ser mais curtos que os franceses, mas que as séries flamengas tendem a ser mais longas, com mais de 100 álbuns.

Em parte graças à sua taxa rápida de publicação e sua serialização em jornais, os quadrinhos flamengos durante sua “Idade de Ouro” (1945-1960) foram tipicamente envolvidos com preocupações sociais e políticas atuais, em contraste com os franceses (Baetens 2005: 34). Quadrinhos que o cartunista flamengo Vandersteen fez para revista Tintin, publicada para leitores franceses, são descritos como seus melhores trabalhos ou como exercícios de assimilação cultural, através da atenuação da especificidade flamenga.

Jan Baetens (2005, 2008) argumenta que até recentemente, cartunistas e editores belgas muitas vezes autocensuraram a especificidade cultural belga, especialmente quando produzem em francês e para leitores em França e que as referências visuais, como os horizontes urbanos belgas, constituíram a significativa especificidade cultural nacional compartilhada pelos quadrinhos belgas de língua flamenga e francesa.

Prof. Dr. Gazy Andraus

Quadrinhos franceses e belgas - Parte 3


 

e - Quadrinhos Contemporâneos: a ascensão da história em quadrinhos adulta, alternativa, artística e de vanguarda

Segundo Luc Boltanski (1975: 39), a partir da década de 1960, a banda desenhada como fenômeno cultural começou a mudar com a chegada de cartunistas de classe média baixa com um nível relativamente mais alto de educação e capital cultural, que muitas vezes tendiam a estudar arte nos “níveis socialmente inferiores do sistema de educação artística” Elas passaram a ser mais valorizadas como arte, graças a esses novos autores.

Os quadrinhos do século XIX já exibiam um fenômeno relacionado. Doré e Petit aspiravam ser pintores, mas obtiveram sucesso com seus quadrinhos e ilustrações.

Hoje, os quadrinhos de Jacques de Loustal lembram a de Cham, que, embora aristocrata, praticou uma forma de arte que estava há muito tempo abaixo na hierarquia cultural-artística mas agora é celebrado como a “9ª arte”. O estilo pictórico de Loustal ajuda estrategicamente a posicionar seus quadrinhos como artísticos.

Futuropolis simboliza uma virada geral em direção à publicação de quadrinhos adultos e de arte que começou nas décadas de 1960 e 1970. Em A Verdadeira História de Futuropolis, (Cestac, 2007) ilustram-se várias maneiras pelas quais os autores do grupo desafiaram a posição inferior dos quadrinhos na hierarquia artístico-cultural, organizando tours de livros com sessões de autógrafos e exposições de desenhos originais, colocando seus livros na seção de arte de uma livraria parisiense e publicando livros em grande formato.

L'Association, na França, fundada em 1990 pelos cartunistas David B, Killoffer, Mattt Konture, Jean-Christophe Menu, Stanislas e Lewis Trondheim, dá continuidade à prática da Futuropolis de publicar quadrinhos alternativos, destacando-se como tal pelo seu conteúdo (muitas vezes auto-referencial e autobiográfico), experimentação formal, e formato físico (preto e branco, brochura e de dimensões atípicas). Eles lançaram o jornal Lapin em 1992.

Miller (2007: 57) argumenta que nos quadrinhos contemporâneos de língua francesa, “as best-sellers das listas continuaram a ser dominadas por” histórias escapistas.

Autores de obras em francês publicadas em tradução para o inglês incluem Zeina Abirached, Marguerite Abouet com Clement Oubrerie, David B, Enki Bilal, Philippe Dupuy com Charles Berberian, Emmanuel Guibert, Marjane Satrapi, Joann Sfar, Jacques Tardi e Lewis Trondheim. Diversos desses artistas alcançaram sucesso nos campos de quadrinhos alternativos e convencionais. Alguns quadrinhos belgas contemporâneos também foram publicados em tradução para o inglês.

Prof. Dr. Gazy Andraus

Quadrinhos franceses e belgas - Parte 2


 

c - (mais) dois fundadores ajudam a criar quadrinhos como meio de massa e forma de arte

 Tal como nos Estados Unidos, a introdução de balões de fala nos quadrinhos em jornais ajudou a constituir um mercado nacional de consumidores na França. Zig et Puce [Guy e Flea], do cartunista francês Alain Saint-Ogan (1895–1974) sobre dois rapazes parisienses da classe trabalhadora que tentam chegar à América para ficar ricos é geralmente citada como o primeiro quadrinho de língua francesa usando balões de fala a se tornar amplamente popular na França. Foi lançado em 1925 como uma história em quadrinhos de página inteira no suplemento do jornal parisiense Dimanche-illustré, cuja tiragem passou de 325.000 exemplares naquele maio para mais de 500.000 em 1930.

Saint-Ogan e o belga Hergé (1907–1983) são figuras gêmeas, ao lado de Topffer e Outcault, que as instituições nacionais inicialmente adotaram como fundadores da cultura francesa e quadrinhos belgas.

O artigo de abertura de Groensteen (1996) na primeira edição da Neuvieme Art, da CNBDI, examina as muitas influências não reconhecidas de Hergé trazidas de Zig et Puce em sua série Tintin. Tintin também apresentava balões de fala desde o início, o que ainda era uma anomalia nos quadrinhos franceses.

d - Séries, escolas e estilos do séc. 1900 até a década de 1950

Tal como fez Topffer, Saint-Ogan e Hergé inspiraram gerações de cartunistas em França, Bélgica, Suíça e além. Christophe é uma figura intermediária chave entre Topffer e Saint-Ogan.

Groensteen afirma que os quadrinhos de Christophe ajudaram tanto a revigorar os quadrinhos como transferi-los para um público mais juvenil no final do século XIX.

Os quadrinhos de Christophe e Candide foram serializados em revistas infantis, respectivamente Le petit Francais illustré e St-Nicolas, antes da publicação em livro.

Vários outros quadrinhos clássicos foram lançados em revistas infantis que assumiam um caráter humorístico ou abordagem pedagógica e destinavam-se a meninos, meninas ou ambos. De 1905, Becassine, apresentando uma empregada bretã gentil, mas simplória, trabalhando em uma casa aristocrática parisiense, roteirizada por Caumery e desenhada por Joseph-Porphyre Pinchon é serializada em La semaine de Suzette, dirigido a meninas burguesas, seguida pela publicação de livros.

A década de 1930 foi uma “‘era de ouro’ da bande dessinée”, durante “a qual tiras clássicas americanas começaram a ser importadas massivamente para a França”, principalmente por meio do Journal de Mickey. Miller lembra-nos que “este ataque” varreu “alguns títulos franceses de longa data, como L’epatant”.

Para Miller (2007: 17), “[o] renascimento da bande dessinée francófona ocorre na Bélgica”, especialmente com Hergé e sua série “Tintin”, iniciada em 1929. Isso levou a “uma segunda era de ouro da bande dessinée”, no “final dos anos 1940 e 1950”.

O desenho do estilo ligne claire é característico desta “escola de Bruxelas” (Miller 2007: 19). A partir de 1938, os quadrinhos foram também serializados na revista Spirou, também belga. Artistas associados à revista incluem Andre Franquin, Jije, Morris e Peyo. A “escola Charleroi” (ou Marcinelle) é conhecida por seu estilo de desenho atomizado.

A década de 1960 viu o início de uma enorme transformação nos quadrinhos, com a chegada de novos artistas, séries e revistas, e o aparecimento gradual de quadrinhos para adultos, em parte através da influência dos quadrinhos underground americanos.

Em 1959, o cartunista belga Jean-Michel Charlier e os artistas franceses René Goscinny e Albert Uderzo criaram revista Pilote. Asterix, de Goscinny e Uderzo, e outras séries passaram daí para sucesso internacional

Vários artistas, como Claire Bretecher, Gotlib, Nikita Mandryka e outros fundaram periódicos, incluindo L'echo des savanes (1972), Metal hurlant (1975) e À suivre (1977).

Alguns quadrinhos voltados para adultos entraram em conflito com uma lei francesa de 1949 que regulamenta publicações juvenis, incluindo quadrinhos, que foi aprovada com o apoio combinado de católicos e comunistas. Pela lei, publicações de quadrinhos foram sancionadas por retratar nudez e violência, por exemplo.

Miller (2007: 26–27, 35–41) observa que as principais tendências nos quadrinhos na década de 1970 foram ficção científica e sátira social, e, na década de 1980, ficção histórica e fantasia heróica.

Prof. Dr. Gazy Andraus

Quadrinhos franceses e belgas - Parte 1


O capítulo intitulado French and Belgian Comics, de autoria de Mark McKinney, do livro The Routledge Companion to Comics, organizado por Frank Bramlett, Roy T Cook, and Aaron Meskin (New York: Routledge, 2017, p. 53 a 61) foi objeto de discussão no Colóquio Científico Virtual do Observatório de Histórias em Quadrinhos, realizado em 10 de novembro de 2023.

A apresentação do capítulo e coordenação da discussão foram realizadas por Gazy Andraus.



a - Origens suíças para quadrinhos franceses e belgas

Em 1996, dois grupos de especialistas apresentaram definições concorrentes de quadrinhos. Um deles, associado ao Centre Belge de la Bande Dessinée (CBBD) em Bruxelas, celebrou o centenário dos quadrinhos, inventados, segundo eles, quando o americano Richard Felton Outcault (1863–1928) introduziu balões de fala em seus quadrinhos Hogan's Alley ou Yellow Kid em 1896; o outro, incluindo Thierry Groensteen, associado ao Centro Nacional de Quadrinhos da França em Angoulême, argumentou, contrariamente que os quadrinhos foram inventados por Rodolphe Topffer (1799-1846), um cartunista suíço falecido 150 anos antes.

Topffer litografou e publicou suas próprias histórias em quadrinhos, a mais curta das quais tinha 52 páginas, em pequenas tiragens. Outcault, junto com outros cartunistas americanos de sua época, criou histórias em quadrinhos e páginas para produção em massa, jornais de grande tiragem, controlados por magnatas poderosos da imprensa. Com Topffer, os quadrinhos assumem a forma de um livro de artista, enquanto os dos cartunistas americanos são um meio de comunicação de massa.

Alguns estudiosos de quadrinhos argumentam que os quadrinhos de Topffer são de fato fundamentais para o futuro desenvolvimento de quadrinhos na Europa Ocidental e além. Vários cartunistas foram inspirados por Topffer

b - Influências transnacionais no balão de fala e publicações standards (broadsheets)

Pesquisa feita por especialistas de quadrinhos sobre as primeiras aparições de balões de fala nos quadrinhos franceses no final do século XIX e início do século XX têm rendido muitos exemplos, incluindo Sam et Sap [Sam e Sap] de Candide, obra colonialista com um grotesco caráter africano negro devendo muito ao menestrel (minstrelsy) e talvez inspirado em parte por Buster Brown.

Esse quadrinho e vários outros franceses do início do século XX são prova da influência de quadrinhos americanos com balões de fala, inclusive os publicados na edição parisiense do New York Herald. Estes últimos incluem Buster Brown, Little Nemo in Slumberland e Little Sammy Sneeze, de Winsor McCay, também rapidamente publicados como livros em tradução francesa. O intercâmbio entre os dois países era uma via de mão dupla na criação de quadrinhos.

Prof. Dr. Gazy Andraus 


terça-feira, 14 de novembro de 2023

Processo de decolonização do quadrinho contemporâneo brasileiro: entre o local e o global



O título acima reflete o conteúdo do artigo de Válter do Carmo Moreira, pesquisador do Grupo COGNA da Universidade Estadual de Londrina, que dá continuidade ao dossiê especial, publicado pela revista 9a Arte, contendo os trabalhos apresentados nas 7as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos.

O artigo analisa o processo de decolonização do quadrinho brasileiro, com foco nas implicações simbólicas e culturais desse fenômeno, examinando como o quadrinho brasileiro se internacionaliza e escapa à lógica de centro, participando ativamente do crescente fluxo de trocas simbólicas globais. Segundo o autor, este fenômeno não apenas enriquece a produção local, mas também contribui para uma compreensão mais ampla da diversidade cultural e simbólica no contexto global dos quadrinhos. 

O estudo não apenas lança luz sobre as transformações acima citadas, mas também contribui para uma compreensão mais profunda dos impactos culturais da globalização neste campo, desafiando concepções prévias e abrindo espaço para futuras investigações sobre a interseção entre o local e o global no cenário artístico contemporâneo.

Trata-se, sem dúvida, de uma discussão instigante, que pode ser acessada em Processo de decolonização do quadrinho contemporâneo brasileiro | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

quinta-feira, 9 de novembro de 2023

Cientistas negras nos quadrinhos mainstream são destaque em artigo da revista 9a Arte



Nem sempre as questões científicas são tratadas nas histórias em quadrinhos com muita precisão, especialmente nos quadrinhos de super-heróis. Sua presença é muitas vezes marcada pela inspiração científica de alguns poderes ou porque alguns personagens são cientistas profissionais nas tramas. Quando a questão analisada refere-se à presença de mulheres cientistas, ela se torna ainda mais capciosa. É fácil elencar um cientista homem nos quadrinhos, mas quando se trata de uma cientista negra, há uma lacuna que indica desconhecimento e ausência

A partir desse contexto, o artigo "Cientistas negras nos quadrinhos mainstream: raça, gênero e colonização", de autoria de Allana Sobrinho dos Santos  e Paloma Nascimento dos Santos, ambas da Universidade Federal da Bahia, teve como objetivo realizar uma pesquisa documental e bibliográfica sobre cientistas negras nos quadrinhos mainstream no período de 1970 a 2022

Segundo as autoras, a quantidade de cientistas encontradas, seus perfis e narrativas apontam uma representação ainda pequena, mas abrem caminhos para pesquisas sobre raça, gênero e ciências em interface com as histórias em quadrinhos. Vale a pena conferir. 

O artigo está disponível no endereço Cientistas negras nos quadrinhos mainstream: raça, gênero e colonização | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br)

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

 

quarta-feira, 8 de novembro de 2023

Sinais de pontuação nos quadrinhos recebem atenção em artigo da revista 9a Arte


Com o título de
"Sinais desacompanhados nos quadrinhos", a revista 9a Arte acaba de publicar, em seu volume 11, artigo da professora Lou-Ann Kleppa, da Universidade Federal de Rondônia.

Enfocando, entre outros, o ponto de interrogação, o ponto de exclamação e as reticências, sinais de pontuação que podem ocorrer isoladamente (em balões de fala, balões de pensamento ou ancorados na imagem) nos quadrinhos, o corpus principal do artigo é formado pelas tiras de Yehuda Moon & the Kickstand Cycleryquadrinhos independentes, produzidos por dois ciclistas canadenses que retratam o cotidiano de uma bicicletaria. Nessa tiras, existe um uso constante desses sinais de pontuação desacompanhados

Como contraponto à produção dos autores canadenses, a autora recorre a The essential Calvin and Hobbes (1988) de Bill Watterson e Deus 1, 2 e 3 de Laerte

Contrastando esses corpora, ela percebe o que denomina como preferências pontuatórias, já discutidas por outros autores, como Cohn (2013), Dahlet (2002; 2006), Kleppa (2023) e Gedin (2019).

O artigo está disponível em Sinais de pontuação desacompanhados em quadrinhos | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

terça-feira, 7 de novembro de 2023

Segundo artigo do Dossiê das 7as Jornadas Internacionais de HQs enfoca obra de Junji Ito


O artista japonês Jungi Ito é objeto do segundo artigo do Dossiê das 7as Jornadas Internacionais de Histórias em QuadrinhosVolume especial da revista 9a Arte, o dossiê traz, no formato sequencial, como artigos científicos, os trabalhos apresentados no evento.

As 7as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos foram realizadas na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, de 22 a 28 de agosto de 2023, sendo o primeiro dia apenas na modalidade remota e os demais com apresentações presenciais.

O artigo "As múltiplas faces do horror: o gótico e a weird fiction em Junji Ito", de autoria de Luiz Felipe Salviano, mestrando em Comunicação pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), reflete sobre o diálogo entre os meios, realizando uma análise comparativa entre uma história do quadrinista, Nagai aYume (Um Longo Sonho), e dois contos de horror: Dream of a Manikin, de Thomas Ligotti, e Der Sandmann, de E.T. A. Hoffmann. 

O artigo pode ser acessado no endereço As múltiplas faces do horror | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

segunda-feira, 6 de novembro de 2023

Revista 9a Arte publica o primeiro artigo do Dossiê das 7as Jornadas Internacionais de HQs



O Dossiê das 7as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos acaba de ter sua publicação iniciada. Volume especial da revista 9a Arte, o dossiê trará, no formato sequencial, como artigos científicos, os trabalhos apresentados no evento.

As 7as Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos foram realizadas na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, de 22 a 28 de agosto de 2023, sendo o primeiro dia apenas na modalidade remota e os demais com apresentações presenciais.

O primeiro artigo publicado, "Desavenças, golpes e navalhas: a capoeira nos quadrinhos O Cortiço", é de  autoria de Robson Carlos Silva, professor da Universidade Estadual do Piauí, e pode ser acessado no endereço Desavenças, golpes e navalhas | 9ª Arte (São Paulo) (usp.br).

Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro

sábado, 4 de novembro de 2023

Clássicos dos quadrinhos nacionais



A tradição de produzir histórias em quadrinhos no Brasil remonta ao final do século XIX, tendo Angelo Agostini como pioneiro desta forma de arte narrativa. E, desde o lançamento da revista O Tico-Tico, em outubro de 1905, a criação de histórias sequenciais gráficas tem sido ampla e contínua no país. Mas, mesmo assim, a memória das obras de grandes artistas é desconhecida pela maioria do público.

Para resgatar o trabalho de quadrinistas veteranos e contemporâneos, a Criativo Editora vem lançando álbuns de quadrinhos de terror, super-heróis, faroeste e mangá na coleção Graphic Books. Nomes como Walmir Amaral, Gedeone Malagola, Franco de Rosa, Paulo Fukue, Rubens Cordeiro e muitos outros fazem parte dessa série.

Os quadrinhos de terror, um dos gêneros narrativos mais importantes no Brasil, estão representados na antologia Tenebris, entre outros títulos. A atuação nesta forma artística e narrativa de Gedeone é evidenciada pelo super-herói Homem-Lua, além das histórias dos X-Men feitas para a editora Gep no início dos anos 1970. Parte da iniciativa de impulsionar o quadrinho nacional no início da década de 1960, no Rio Grande do Sul, as aventuras do policial Aba Larga, de Getúlio Delphim, representa elementos da cultura gaúcha. Já O Primeiro Samurai, de 1959, foi um mangá criado por Julio Shimamoto

Até o momento, a editora publicou mais de 50 títulos.

Prof. Dr. Roberto Elísio dos Santos